quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

Passa o insulto

Acontece com frequência no diálogo português.

Na problemática do insulto estão sempre várias causas: as pessoas. Sem elas não seria possível, como é óbvio, ouvir um insulto. Por exemplo, se eu der um pontapé num cão, não se ouve mais do que um ganido. O cão provavelmente não me está a insultar, pois não tem inteligência para tal. Por isso, sempre que o faz, penso que é por lhe surgir, algures, um sentimento de dor. Falamos aqui dos instintos primários, que também ocorrem no Homem: Quando levamos uma murraça, mesmo no meio dos olhos, a primeira coisa que acontece é uma pequena sensação de dor, e depois sim, passamos ao insulto. Ou seja, aqui, identificamos claramente, que o insulto é algo que vem da inteligência, pela simples lógica de que não existe nenhum ser vivo mais inteligente que nós. Ou então somos muito burros ao não perceber que os animais se insultam. Nesse caso, deixávamos de ser muito inteligentes, para ser apenas medianamente inteligentes. Concluindo, quando vemos os animais nas suas lutas, dizemos que ganem, que rosnam, que uivam e se eles, por exemplo, nos vissem a dialogar diriam que, por vezes, nos insultamos. “É pah, já viste aqueles humanos, eles não rosnam. Insultam-se. Que inteligentes!” – Diria, por exemplo, um gato (se pudesse falar, obviamente).

Agora, que já divagámos sobre a identificação do assunto que nos trouxe até aqui, vamos tentar perceber como é que se “passa” o insulto e descobrir que o próprio insulto é muito relativo. E é esta relatividade que lhe está inerente, que os portugueses utilizam muitas vezes. Num exemplo, muito aleatório, imaginemos que um certo individuo me chama “bonito”. Sinceramente, eu não ia gostar. Sei que sou apenas um pão, e chamarem-me bonito seria um insulto, principalmente vindo dum sujeito do sexo masculino. Como é que o insulto aqui pode ser relativizado? Noutro exemplo, quando dizemos a alguém “És uma bela bosta”, percebemos que o insulto é algo relativo. Pode-se sempre argumentar dizendo “Sim, mas há bostas piores do que a que eu sou!”. Nesta situação está-se claramente a passar o insulto. Sim! Como no jogo do “passa morte”, o insulto também pode ser passado, como quem se esquiva. Quem está a insultar entra logo numa cadeia de reacções químicas, que dentro do seu cérebro, levam à raiva, ao nervosismo, entrando no jogo do insultado. Ainda, outro caso, é o de colocar determinantes antes do insulto. “És uma bosta!”. Sim, mas qual? “um” é muito aleatório, pode ser qualquer um. Grande, pequeno, castanho, verde…

Assim, colocar adjectivos ou mesmo determinantes pode ser lesivo para um diálogo de insultos. Quando se insulta tem que se ser específico, senão mais vale a pena não insultar.

“És a bosta!”. Aqui não há hipótese. O insultado, fica num beco sem saída, como um pedaço da mesma na sanita. A única hipótese é dizer “na na, a bosta és tu!”. Mas não se vê isto nos adultos, pelo que só se pode dizer que eles não sabem, então, insultar! Conseguimos ver este tipo de diálogo de insultos, nas crianças. Por vezes, até entram naqueles despiques de insultos, onde se repetem tantas vezes, até que sobre o último, e mais valioso insulto: “não, és tu”, “não és tu” “a bosta és tu” “não, não, tu é que és”…. “nha nha nha nha nhaaaaa, ganheeeeiiiii!!

Chegamos então à derradeira conclusão, que quem insulta bem, não é afinal o mais inteligente. Muito provavelmente, quem insulta nem é mesmo muito inteligente, pois aí talvez, antes de insultar, teria encontrado um argumento. E os argumentos, são bem melhores que insultos.

1 comentário:

  1. Que bela bosta que para aqui se lê!
    Mas estás a dizer que quem chama palhaço a outro ou faz corninhos não é inteligente!? Como ousas??
    A este tema apenas tenho a acrescentar que o insulto pode não o ser, isto é, pode fazer parte do dialecto cultural de uma região, tal como acontece no Norte e em especial na zona do Porto. Quantos nunca ouviram um "este gajo é um ca%r&lh#" ou um "que m$rd§ incrível"?
    Um bem haja para todos os gajos e gajas do c%r£lh& que lêem este blog!

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